Um momento na história da humanidade

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Em uma noite fria de São Paulo, partimos do Aeroporto de Guarulhos em direção a Califórnia, mais precisamente para a cidade de Pasadena, nos Estados Unidos.

O objetivo de minha missão era levar 4 estudantes brasileiros de um curso de Astronomia no interior do Rio de Janeiro, em direção ao JPL, sigla para Jet Propulsion Laboratory.

A partir de lá, poderíamos acompanhar em tempo real mais um capitulo da História de nossa civilização. Explico: estávamos acompanhando os preparativos para a possível aventura da descoberta de vida em outro planeta, em Marte!

Naquela altura, pouco sabia se realmente poderíamos prestigiar tal evento de dentro deste famoso complexo, gerenciado pela NASA, mantido e conduzido por recursos internacionais privados. O JPL mantém o nome de Laboratório de Propulsão até hoje, apesar de não realizar mais pesquisas deste tipo.

O objetivo atual do JPL é construir, enviar e acompanhar sondas interplanetárias de todos os tipos, desde simples satélites de pesquisa até rovers.

Neste caso em específico, estávamos nos dirigindo para assistir o pouso da Sonda Curiosity no Planeta Vermelho.

Um projeto de bilhões de dólares viajando pelo espaço por praticamente 9 meses, este rover é considerado um grande salto evolutivo na história dos robôs interplanetários de pesquisa.

Primeiro, porque até então não se envolvera uma quantidade de nações no projeto tão significativo quanto neste, mais de 15 no total. Segundo porque se avaliarmos que os rovers sempre tiveram em média não mais que 200 kilos, a Curiosity tinha uma tonelada.

Pois é amigos, não estávamos mais enviando um brinquedo e sim uma máquina extremamente adaptada para sobreviver em ambiente inóspito, com ferramentas de precisão de corte e coleta de rochas, gerando informações e analisando amostras a partir de sub-laboratórios acoplados em sua estrutura, de forma muito mais rápida e precisa que nenhuma outra sonda já fez. Tudo isso para focar em sua missão de encontrar vida (ou restos dela) a milhares de quilômetros de nosso planeta mãe.

E desta forma foi, que chegamos em Pasadena, desembarcando do Aeroporto de Los Angeles. De lá pra NASA, teríamos que alugar um carro e viajar mais 40 quilometros até o evento. Sobraria tempo para conhecermos o famoso Observatório Griffin, do alto das colinas de Los Angeles e de onde se tem uma vista deslumbrante da cidade, podendo-se tirar uma bela foto com a placa de “Hollywood” ao fundo. A famosa foto que todo turista precisa para alimentar seu ego do “eu estive lá”.

Como tudo nos Estados Unidos, o observatório não só é aberto ao público, mas também da um show de infra-estrutura, um exemplo importante para nós tupiniquins. Localizado dentro de um parque com vasta vegetação e vagas para o carro, é possível entrar visitar o museu gratuitamente, tirar fotos das enormes e antigas estruturas de observação das estrelas e tomar um banho de conhecimento em suas amostras, muitas delas interativas. Por fim, é possível almoçar em um restaurante com uma vista belíssima da capital e gastar um dinheirinho com compras “nerdianas”.

No dia seguinte, partiríamos para conhecer as instalações da NASA e talvez prestigiarmos o pouso ao vivo da Curiosity, quem sabe?

Chegamos a porta de entrada do JPL e na guarita nos identificamos com a reserva da Agencia Marcos Pontes, pois tínhamos horário marcado com uma visita guiada com um dos funcionários do JPL.

A funcionária Krystie era uma canadense que nos recebeu de braços abertos. A visita começaria a partir da recepção, onde nossos nomes precisavam constar na lista e nossos passaportes teriam de ser momentaneamente confiscados até o término do passeio.

Devido ao evento que lá aconteceria, haviam diversas redes de televisão do mundo inteiro, estavam por todos os lados e o movimento no laboratório estava acima da média.

A visita ao centro tecnológico começou com uma caminhada a pé pelas ruas do complexo, a uma temperatura nada convidativa de 34 graus celcius, com o ar seco e poluído daquele rigoroso verão californiano. Nossa sorte, era que a cada prédio que entravamos, podíamos nos deliciar com os potentes sistemas de refrigeração tão comuns e eficientes dos americanos.

O primeiro prédio visitado era nada mais, nada menos, que o laboratório de onde se construiu a Curiosity. Fomos levados pelos caminhos reservados aos visitantes, um atalho lateral de onde tínhamos a visão por um aquário do laboratório, já que para entrar de fato seria preciso vestirmos roupas especiais, passarmos por diversas baterias de ventos, salas de isolamento e tuneis de esterilização, para daí então chegarmos do outro lado do aquário.

Como não éramos cientistas, o máximo que podíamos era bisbilhotar das belas janelas de vidro o ambiente mais limpo do mundo, tudo para evitar-se a contaminação do laboratório e a inadequação da obtenção dos resultados da vida extra-terrrena. Lá, podia-se ver partes sobressalentes de diversas sondas e também o inicio da construção de um satélite, até então não revelado.

Partindo deste prédio, caminhamos até o laboratório de simulação, de onde presenciamos a única replica funcional da Curiosity existente. Esta copia estava ali para em casos de prevenções com sua irmã gêmea a 500 milhões de quilômetros, era dali que poderia-se tirar soluções e encaminhar ao centro nervoso de operações.

E enquanto alguns deles mexiam no motor de propulsão radioisótopo , um pato de borracha repousava em cima de uma pedra marciana, como a nos dizer comicamente: em caso de encontro alienígena, o que fazer?

Da mesma forma, by the american way, pode-se ver todo o laboratório sem atrapalhar o trabalho dos cientistas, em plena contagem final para o pouso da sonda.

Caminhando mais um pouco, finalmente chegamos ao centro operacional da sonda. Ou melhor, das sondas: eram telões e computadores por todos os lados, pois dali não se acompanhava apenas a Curiosity, mas divervas outras sondas interplanetárias que mantinham seu trabalho solitário pela imensidão do universo.

A moderníssima sala de operações dava uma ideia do que estava por vir. Assistindo as telas, cada sonda ainda operante no espaço mantinham sua rotina mandando dezenas de informações por minuto, que chegavam na tela criptografados como imensos links incompreensíveis de URL. Isto por si só davam uma ideia do volume de conhecimento gerado naquele centro de pesquisa . Enquanto todos trabalhavam no computador, estavam na verdade em Júpiter, Saturno, Urâno ou mesmo no exemplo da Voyagger (que podia-se ler em sua tela links bem mais espaçados e fracos) perdido em algum canto do universo.

O que mais me chamou a atenção era um pequeno joystik, nada diferente de qualquer produto de entretenimento repousando em uma das mesas. Quem manejava com maestria os últimos testes era Paolo Bellutta, um italiano naturalizado americano que era nada menos que o Driver da Curiosity. Solicitei que ele autografasse minha camiseta o qual ele riu descontraidamente, mas é claro que não podia sair dali sem tirar uma foto com ele também.

Tudo muito lindo, até que a decepção veio, como se era de esperar, quando nossa guia informou que não poderíamos assistir o evento de dentro do laboratório (off course!) e então nos dirigimos a uma sala de imprensa da Mars Society, que realizava um congresso ali perto.

A Mars Society é uma entidade focada nos estudos e acompanhamentos dos avanços sobre o Planeta Marte, uma verdadeira legião de fanáticos nerdianos que interagem como observadores e consultores sobre este tema para a NASA. Ora, se por um lado eu havia ficado decepcionado em assistir através de um telão e não da sala “D”, por outro fiquei “ abestado” sobre quem seriam meus novos companheiros de festa: estavam lá o vice-presidente da Virgin Galactic, o presidente da Space-X, diversos astronautas, destacando-se entre eles Story Musgrave ( o único a voar em todos os 5 ônibus espaciais e responsável por instalar o telescópio Hubble em órbita) e por fim, nada menos que Buzz Aldrin, membro da primeira tripulação a pisar na Lua, a Apollo XI.

Aliás, pra mim estava meio impossível desgrudar- me desta lenda. Eram tantos nomes “dando sopa” no local que ficava difícil entender a falta de bajulação.

Já era noite do dia 6 de agosto, estávamos todos acompanhando lado a lado, cada passo da missão. E conforme a contagem regressiva para a entrada na atmosfera marciana se aproximava, um fato não menos intrigante deixou a todos na sala de cabelos em pé: a menos de 2 minutos do impacto com a atmosfera, a transmissão via internet com o robô literalmente caiu, causando grande furor e expectativa na sala.

Alguns se levantaram da cadeira com as mãos na cabeça e com a face visivelmente desolada. Mas depois soubemos que foi apenas uma pane causada pelo impacto com a atmosfera e que a instabilidade estava prevista. Ora, um sinal de rádio cair a milhares de quilômetros de distancia devido a uma ação extremamente rigorosa na reentrada, não era nada pra se reclamar…

Assim, em pouco tempo o contato foi reestabelecido, e a sonda pousou com sucesso! A confirmação do pouso com as palavras “We got it” chegou acompanhada da explosão dos observadores, que pularam e abraçaram-se como em um gol no futebol. Estouros de garrafa de champagne eram ouvidas aos brados de “U-S-A, U-S-A, U-S-A”! E enquanto e emoção imperava, com alguns cientistas chorando como criancinhas no playground, 2 minutos depois alguem disse “we have one email” e logo apareceu na tela o que seria a primeira foto de Marte enviada pela Curiosity. E mais um gol de emoções na plateia!

Depois da primeira foto ultra comemorada em preto e branco, onde não se via nada a não ser uma sombra ao chão, de repente muitas outras começaram a aparecer seguidamente na tela, cerca de uma foto por segundo, em cores e com visão panorâmica de Marte, um verdadeiro orgasmo nerdiano.

E desta forma, mais uma missão foi cumprida. Um momento da história revelada de perto. Eu estive lá e pude notar a incrível dedicação de homens desbravando mais um dos mistérios do universo. A busca por traços de vida extra-terrena agora pode ter seus dias contados. De fato, o céu não é o limite!

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